Direito à saúde e amianto
O Plenário iniciou julgamento de ação direta, ajuizada pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) e pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA), em face do art. 2º, “caput” e parágrafo único, da Lei 9.055/1995 (1), que disciplina a extração, industrialização, utilização, comercialização e transporte do asbesto/amianto e dos produtos que o contenham.
Primeiramente, o Tribunal, por maioria, reconheceu a legitimidade ativa “ad causam” das entidades autoras. Considerou existir vínculo de pertinência temática em relação aos objetivos estatutários que legitimam a atuação das entidades autoras e o próprio conteúdo da norma legal objeto de impugnação.
Vencidos, no ponto, os ministros Alexandre de Morares e Marco Aurélio, que não reconheceram a legitimidade das referidas associações. Para os ministros, o combate à legislação, que possa causar danos aos trabalhadores, não tem a ver com a razão de existência das associações.
No mérito, a ministra Rosa Weber (relatora) julgou procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do art. 2º da norma impugnada. Afirmou que a tolerância ao uso do amianto crisotila, da forma como encartada no art. 2º da Lei 9.055/1995, é incompatível com a Constituição Federal (CF/1988).
O devido equacionamento da Lei 9.055/1995, à luz dos princípios e valores consagrados na CF/1988, tem como principal vetor a cláusula constitucional do direito à saúde. Na discussão relativa à constitucionalidade da norma federal que regula a exploração do amianto, a invocação da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho e da defesa do meio ambiente têm, como centro de convergência, a proteção da saúde.
A CF/1988, tomada como sistema, autoriza o Estado a impor limitações aos direitos fundamentais, em face da necessidade de conformá-lo com outros direitos fundamentais igualmente protegidos. Assim, o direito fundamental à liberdade de iniciativa, consagrado como fundamento da República Federativa do Brasil e princípio geral da ordem econômica, não impede a imposição, pelo Estado, de condições e limites para a exploração de atividades privadas.
Além de não impor a substituição do uso do amianto sempre que tecnicamente viável, a Lei 9.055/1995 não prevê mecanismos de revisão e atualização periódicas das estratégias de controle dos riscos à saúde oriundos da exposição ao amianto, bem como dos limites de exposição ao amianto crisotila, tendo em vista a marcha do desenvolvimento tecnológico e o avanço do conhecimento científico.
Ademais, ao não prever mecanismos de redução progressiva de resíduos que tenham o amianto, em pó ou fibra, como um de seus constituintes, a Lei 9.055/1995 também está em desacordo com a Convenção de Basileia, que trata do controle de movimentos e depósito transfronteiriços de resíduos perigosos.
Concluiu que, diante das determinações constitucionais direcionadas ao legislador, a tolerância ao uso do amianto crisotila, tal como positivada no art. 2º da Lei 9.055/1995, não protege adequada e suficientemente os direitos fundamentais à saúde e ao meio ambiente, tampouco se alinha aos compromissos internacionais de caráter supralegal assumidos pelo Brasil e que moldaram o conteúdo desses direitos, especialmente as Convenções 139 e 162 da OIT e a Convenção de Basileia, sendo caso de inconstitucionalidade por proteção insuficiente.
Em seguida o julgamento foi suspenso.
(1) Lei 9055/1995: “Art. 2º O asbesto/amianto da variedade crisotila (asbesto branco), do grupo dos minerais das serpentinas, e as demais fibras, naturais e artificiais de qualquer origem, utilizadas para o mesmo fim, serão extraídas, industrializadas, utilizadas e comercializadas em consonância com as disposições desta Lei. Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, consideram-se fibras naturais e artificiais as comprovadamente nocivas à saúde humana”.
ADI 4066/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 17.8.2017. (ADI-4066)
Parte 1:
Parte 2:
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Parte 2:
Decisão publicada no Informativo 873 do STF - 2017
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